terça-feira, 22 de novembro de 2011

PRELIMINARES


-Azul é a sua cor predileta?
-Não.
-... Porque você esqueceu um isqueiro azul comigo e hoje você está com outro isqueiro azul.
-É que eu peço um isqueiro e sempre o carinha me pergunta qual cor. Eu falo qualquer uma e ele me dá.
-Vai ver que o azul é a cor que menos sai a pedidos!
-Sei não.
-Qual é a sua cor predileta, então?
-Ah, velho, vamos falar de outras coisas?
-Diga aí!
-De fogo.
-Tira a mão daí!
-Me passa o isqueiro!
-Qual, o azul?
-...
-A minha cor predileta é o fogo!
-Tira...

22nov2011

sábado, 5 de novembro de 2011

TARTARUGA


A cara da tartaruga era de dúvida.
Um quadrúpede parado por natureza dando um tempo pra refletir a sua dúvida.
Ela fica parada, demorando no tempo e a conclusão parece não chegar.
Qual é a dúvida da tartaruga? Por que ela fica estacionada com cara interrogativa, olhando pra direita e pra esquerda?

Na terça feira a tartaruga chegou com suas compras:
um par de camisa, short e tênis brancos.
Abriu seu guarda roupas branco e pendurou nos cabides brancos suas compras brancas.

O estranho é que junto à nova camisa branca outras trinta e sete também eram brancas e iguaizinhas.
Os oitenta pares de tênis também. E os quarenta e três shorts, do mesmo modelo e tom de branco.

É aí que voltamos ao estado duvidoso que a tartaruga se encontrava.
Ela não sabia que camisa, short e tênis usaria pra sair na quarta feira.

A tartaruga começou a ficar nervosa e suava.
Da nervosia passou para um estado ansioso que a abateu e a fez suar mais.
Ela então começou a experimentar as camisas com as quais ela combinaria os shorts e tênis brancos.
A conclusão não chegava e ela fez xixi de raiva.

O xixi deu um tom amarelado no short branco e deixou uma gota no tênis branco.
A tartaruga sorriu. Agora só faltava escolher dentre as trinta e sete camisas brancas.

Quarenta graus, pleno verão:
a tartaruga decidiu ir sem camisa, com o casco à mostra.

Na quarta feira, lá estava a tartaruga com a mesma cara de dúvida diante de uma loja onde se lia:
DESMONOCROMATIZE SUA VIDA DENTRO DA ARCO IRES TINTAS

Qual cor?
Era essa a nova dúvida da tartaruga.

2010

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

A CASA BRANCA (atenção: conto pornográfico)


A casa era branca e cúbica.
Grande, espaçosa e sofisticada. Gosto requintado, de tendências contemporâneas em design.

Morava o dono da casa e a empregada que ele fodia quase todos os dias.
Ela se sentia a dona da bela casa, quando dava o cu para o patrão.
O patrão dava presentes de camelôs, que ela já conhecia, de praxe.

Quando o patão queria que ela fizesse dupla penetração, junto com seu melhor amigo, ele melhorava o presente: rolava uma lingerie de marca famosa, original.

Ela imperava e cavalgava na linda casa quadrada...

No outro dia, recebia tratamento austero. Nada aconteceu. Nem precisava advertir.
_Pega, faz, mais!
Só ordens até a lua apontar redonda...
Aí, ele parecia namorado. Tirava a calça e deixava que o pau endurecesse dentro da cueca branca e aí tirava todo o resto.
Eles se chupavam muito. Ela gemia muito. Ele gostava muito. Dava uns tapas na bunda dela e muito.
A casa tinha vários servidores: bares automáticos, máquinas de cigarros diferentes, refrescos, camisinhas, chocolates, vale brindes, bijou para presentear a empregada que colecionava.
Ela ganhava bijou quando deixava que ele a fudesse com mais violência. Fuder pra ralar.

A casa tinha home theatre.
Na tela de cinema, altos pornôs. Os proibidos por lei. Os pervertidos.

Ela adorava essa heresia. Ele sabia disso. Sabendo disso, dominava a empregada para tudo que sua libido desejava. Era rico.

O cu da empregada estava do jeito da buceta, aberto de tanto levar estocadas.
Ele gostava de esporrar nos cabelos dela, ou na garganta.
Ela tinha que engolir. Já ficou roxa quando cuspiu.

O patrão soltava a grana para a empregada não andar fedida, nem mal vestida. Tudo que era pra beleza da empregada, soltava a grana.

A casa se não estivesse na mais perfeita ordem...
Era o patrão e uma mulher muito roxa na casa.

Ela gozava com a variação de temperamentos dentro da sua casa.

No auge de uma trepada, ensandecida, ela estrangula o patrão.

Todos os papeis já tinham sido providenciados por ela.
Agora ela dá a bunda pra bancar a casa.

No quarto espaçoso, fica o advogado. No de cima, o delegado. No dela, um duplex com piscina, sauna, vista panorâmica, fica o soldado chinfra na graduação policial. Era como se fosse a reencarnação do seu ex patrão.

Mas agora, a casa era dela.

11e12dez2005

"UI" "SLOPT"


Uma Roela despencou dum lugar alto
e desceu rolando.

Passou por momentos terríveis!
Trombou num Tatu bolado no início do caminho, no meio do caminho emberedou um Buraco profundo, que ecoou suas súplicas:
_ Valhei-me!

E por fim,
um Gancho.
A Roelinha enganchou no Gancho.
Com força, velocidade e impacto.

O Gancho ficou impactado:
_Que roela!

Desculpe-me Sr. Gancho, eu despenquei e...
_Não, não diga mais nada. Você está salva.
_Onde devo desenganchar-me?
_Oh, espere...
_Tudo bem.
"SLOPT"
_Ui
_Ui
_Obrigada!
_Escuta, minha vida é aos ganchos e reganchos. Não é sempre que uma roela linda como você engancha no meu gancho com tamanho furor.
Fiquei deslumbrado por você e creio já estar apaixonado!
Sendo assim, proponho viver eternamente enganchado em você, minha redonda e roliça roela cadente...
_Não.
Tem um parafuso na jogada. Ele ficou lá em cima. Foi ele inclusive, que numa de suas pegadas, me fez despencar até você
_Então, eu te atraí!
_Aaai! Me desgarrancha, gancho chato! Quero subir...
_Hum!
_Roela!!
_Parafuso!!

Numa ganchada, o gancho enganchou novamente na Roela, que gritou e levantou-a nas alturas.
Ela caiu de boca no Parafuso e encaixou rodopiando feito uma louca.

O Tatu que viu tudo, ficou mais bolado ainda.
E o Buraco ecoa agora os gritinhos da roela rodando pra cima e pra baixo no parafuso.

O Gancho encurvou-se até deixar de ser gancho. Virou uma roela e desceu ladeira abaixo tentando outra sorte.

10jul2007



AMARELA ALARANJADO


Uma bicicleta amarela rodava no quilômetro, evitando levar as coisas para o beleléu.
Um dia saiu de sua garupa um velocípede amarelado que virou um triciclo grande e lustroso.
Foi capturado.
A bicicleta amarela saiu alucinada atrás, trombou com um trem, ficou toda descascada e entortada.
Enferrujou.
Foi reciclada e virou capô.
Hoje ela faz parte de um fusca alaranjado e atravancado, que foi parar no DETRAN.
Um dia foi leiloado o fusca.
Ganhou um motorista de alma retrô, que lembrava sempre de uma bicicleta amarela, quando ainda não tinha carteira de trânsito.

18set2004

CHORINHO


choro: os acordes que ferem meu tato
choro seco
choro pelo calo
calado choro sem o tom
É uma orquestração que leva o dedo calejado aos olhos avermelhados
É um chorin.

VELHOS TEMPOS


Velhos tempos:

vão-se os anéis,
ficam-se os dedos.

Hoje:
vão-se os anéis,
os dedos ficam no chão
e a alma sobe.

14set2006

PARA SEMPRE


As fortes cores de antes
pintavam o branco depois

Desbotavam-se em um durante
apagando do curto colorido dantes

a crente cor persistente
Negro luto de agora, por não dizer de hoje

24nov2010

Ô


Dependendo da pedra no meu caminho, eu compro um apartamento
Dependendo da pedra no meu caminho, eu desvio ou coleciono
Dependendo da pedra, Carlos, crack

04dez2005

STREEP TEASE


O frio gelava os dedos,
pôs os anéis;

A nuca ao vento,
pôs colares;

Quanto tempo!
Pôs relógio;

Meiou os pés
e esfregou bastante o pênis

Agora estava preparado para tirar a roupa.

29jul2005

ELA


Um calhamaço de papel
uma caneta sem marca
Ela

Três pontos reticentes
três tremores
Ela

Caneta cheia
calhamaço branco
Tanto já escrito

Tantos pontos finais
Qual final
e a finalidade

Ela...

Não preciso mais de papeis
não sai mais tinta da caneta cheia
deixe a reticência

Deixe Ela

10set2003

EU PASSO!


A expectativa de uma vida estava para resultar naquele abrir de olhos para um novo dia. Dia frio, de noite anterior fria. Mas os olhos do rapaz não se abriram pela manhã. Mantiveram-se abertos durante toda a madrugada. Frio. Imobilidade dentro do cobertor, imobilidade de pensamento.
Ideia fixa, recordações de última hora. Uma prova seria dada, e ele seria testado.
Ora pipocas, sou experiente!
Afinal de contas, o que é uma prova!
E respondeu:
é para provar que você pode continuar.
Como não continuar?
E respondeu:
Não passando na prova.
Mas o rapaz insone, de olheiras, sorriu. Eu vou.
Saiu com duas horas de antecedência, depois de toda a higiene feita com esmero.
Chaves, prova
ração para o cachorro, prova
recado para a empregada, prova
garagem, prova
carro, prova
sinais abertos, mais próximo da prova.
O rapaz chegou na sala.
Sentou-se na quarta fileira, terceira cadeira da esquerda pra direita.
A perspectiva era perfeita para não ser pego colando.
Ele sempre conseguia, era experiente.
Era isso que tinha que provar.
O professor Tilinho não poderá vir aplicar a prova de hoje, disse a coordenadora Udila.
Eu aplicarei essa prova.
Terezo foi humilhado pela coordenadora Udila naquela manhã.

19fev2008

UM POUCO MEIO GRANDE


Em cima do criado mudo
está meu coração de pedra
Ou estará na cômoda?

16out2004

PASSAS E UVA


Como Passas rápido,
observou a Uva
Parece até que o tempo se divorciou do relógio!

29nov2003

TEMPOS DESESPERADOS


Tempo destemperado
como moscas
passa tempo
voo com elas

05dez1999

CRUZ


em si carrega
cruento martírio

mundo de olhares
em ti reflete, o unificado suplício em nós cruzados

a cruz cruza
e reproduz

14dez1999

E AGORA, OPORTUNIDADE!


Lápide, minha filha
solte o péssimo
que uma lépida borboleta
forte de cor
insiste em vlapear sobre o nosso desfecho eterno:
canteiro branco, só branco

13jul1999

UMA PALAVRA POR OUTRA


Os sinos voam sempre
entoar sons pra sua felicidade
alça-os

26mai1999

SAMBA 2


Essa dor que a química não alcança
vibra no meu amor
retumba na minha impotência
e apenas olha pra você

faz da poesia um objeto inútil, palco da morte
e como subtexto, sua vivacidade

meu Deus, como é duro endossar as canções de amor
e como é fácil gritar em desafino, que te amo

sofrem pelo aspecto provisório do amor
sofro pelo aspecto definitivo do meu

4e26out1998


ZOO


Porta aberta
gata morta

vista parada
na janela transitada

joelho calejado, o louva-deus
nas penas de ganso abatido

girafa de pescoço pro subterrâneo
vê os passarinhos voarem lá dentro

patinho feio nada no chão
mergulha contra o ferro

domingo que vem
voltaremos novamente

22set1998


MATEMÁTICA


Números,
somos nós a raiz

eu e esse outro que me subtrai
que acelera a soma
numa equação difícil

número que me exata
estando eu fracionado
cada vez mais ímpar, menos absoluto

sou um número real e irracional
e você me faz conta conjunta

12e13set2002

A FILA


Não pareamos
e peitos de par em par
andam bicando para mim.
O próximo!

26dez2001

SAMBA


Papel no chão
solas gravadas nas palavras caras

colado de lágrimas
o epílogo da despedida

rasgado o eu te amo
reciclo minhas lembranças

curta duração tem uma carta de amor
já não comovente, é papel no chão e destinatário ausente

minha carta de amor
virou tapete

24e25out2001

PAPEL E CANETA


Do meu lado direito, tenho uma caneta
e minha alma está em papel.

26dez2001

O CONHECIMENTO


Conhecimento,
uma arrecadação que estará
sempre em débito e sem fundos.

05ago2001

MULHER


Bendita fenda milenar, mulher,
que trinca suas pernas
e o novo brota.

Acolho-te no mais arcaico dos encontros;
amo-te, e a renovação deste ato, faz do belo uma constância

08mar2001

AGITE ANTES DE USAR


AGITE ANTES DE USAR me lembra o amor,
que aposenta o sumo e se apresenta aguado.

30jun1995

terça-feira, 11 de outubro de 2011

Finalmente!


Era pra ter alguém em casa quando ele chegou.

Não chamou por ninguém, mas lembrava disso a todo instante.

Fez tudo o que fazia quando chegava a casa.

Ninguém em casa.

Chegou a sua hora de dormir e absolutamente ninguém em casa.

Desceu as escadas e antes do primeiro degrau viu seu irmão ensanguentado, de cabeça quebrada.

Ele estava estranhamente pendurado na parede. Por fim deu-se conta de que todos os outros cinco da casa jazem.

Chorou como nunca

Entrou em histeria

Puxou os cabelos do peito

Da cabeça

Da perna

Do ouvido

Do bigode

E do nariz.

Tremeu todo, perguntou por quê?

Viajou pra outra cidade e pediu que os parentes cuidassem das cremações.

Voltou e sentiu que a casa ficara só para ele;

Assim como Marta, a empregada que não morreu.

Marta sabia de coisas que ninguém poderia saber a seu respeito.

Coisas de quarto.

Ele desejou a morte também dela.

Ela aceitou, não tendo tempo para o arrependimento.

11/10/11

João.

VOU LHE ENTREGAR UMA FLOR


Vou lhe entregar uma flor mas não vou receber dinheiro por ela

CU tem que ter assento.

06/10/11
João

segunda-feira, 3 de outubro de 2011

O Balão do Francisco


Numa respiração boca-a-boca, encheu-se de graça o balão.

Com um nó na garganta e o vital estrangulamento, manteve em seu íntimo o hálito de Francisco, seu progenitor.

Nenhuma frincha deixava esvair o ar gostoso que o fez crescer e aparecer.

Encheu-se de altivez e vida longa, assim esperava!

Num dia colorido, no parque da cidade, o balão cheio ficou um pouquinho sem ar ao ver um irmão que voava.

Que maravilha, pensou!

Francisco ao notar que ele tinha murchado um pouquinho de tristeza, foi brincar com seu balãozinho junto a outras crianças. O balão voava de mãos em mãos, todos riam e se alegravam bastante. Mas o balão não esquecia do irmão que flutuava: ele consegue voar! E deixou mais um pouquinho de ar escapar.

Francisco vendo seu abatimento, sabiamente, como todas as crianças, colocou o balão no colo, o acarinhou e lhe disse ao pé da orelha:

Aquele balão pode sim, voar. Mas repare que ele está engaiolado por aquela cordinha, ele não está a mercê do vento, saltando de lá pra cá, dali pra colá. Ele está preso, é um balão em que seu silêncio pesa como asas quietas e recolhidas. Ele lá de cima, não participa das nossas brincadeiras, não se diverte sendo acariciado pelas mãos infantis. Uma corda o mantém distante, sem autonomia. Você pode rolar na grama, sentir o toque das flores, rebater-se nas árvores, passear com a brisa e ficar bem pertinho de mim. Você foi beijado para nascer, tem dentro de si o arzinho quente que veio do meu coração. Seu irmãozinho apesar do seu potencial de voar, tem dentro de si um gás frio. E caso ele queira desvencilhar-se do seu dono e ganhar o céu, ele voará sim, mas pra subir solitário até a uma pressão que o estoure. Morte prematura e bruta, ao passo que você, meu redondinho, ficará velhinho junto de mim. E não me importará suas ruguinhas, se tornará meu pequeno maracujá!

E quando for a hora, desatarei seu nó para que o nosso ar possa apagar até a última velinha do seu bolo de aniversário.

Para o meu filho Francisco.

João.

10/10/10

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Deitou ao chão


Deitou ao chão.

Não. Ele não deitou ao chão. Ele espatifou-se, com violência, ao chão. A ponto de saírem coisas lá de dentro.

Rosa!

Bateu a porta e gritou. Sua anti-sala. Ali era dele.

Cortou a rede da janela. Já estava invalidada, suja e cheia de merdas de pombos.

Apesar de bela vista à janela, nem colocou reparo. Virou-se, encheu até o tampo de uísque e tomou.

Foi olhar a vista da janela. Jogou aquele objeto que sempre estava ali. Com força e liberdade.

Rosa viu a cena. Contou as janelas em coluna. Era o quinto andar. A porta pantográfica do elevador. Era sempre tão dramática!

Altair abriu a porta sem cuidados.

Levou um tapa na cara.

- Você já fez coisa pior e eu não te quebrei com aquele objeto de bronze! Perdi a chance!

Tirou e atirou. Era a arma de Atalaia, que ele não gostava de ter. Estava com ela já a muito.

Passou pela dramática e ao sair da portaria, pisou nas coisas que saíram de dentro do bronze.

domingo, 7 de agosto de 2011

Propaganda


Ganhadora Profissionais do Ano 2011

sexta-feira, 24 de junho de 2011

Psiu


Psiu,

O silêncio é composto, é transitado, interferido, exige força.

Não combina, impõe expectativas.

É barulhento, incomoda, é meio desequilibrado, não responde: adia o pensamento, protela.

Silêncio reverbera, não condiz em sua etimologia,

não resolve, por estar suspenso na realidade.

É sono sem sonho, é abter-se.

O pensamento grita, o silêncio mal dá-se conta, ele não é calmo,

Amortece mas não salva.

Silêncio é um estado de espírito em debate, fugitivo, que só reflete teu umbigo, tua vontade de silenciar-se.

Teu umbigo se expressa, se contrai em Mi Bemol.

O silêncio é curto, é moribundo e nunca teve a arte de calar-se.

Contraditoriamente o silêncio é perfeito.

17mai2010

terça-feira, 26 de abril de 2011

O Quadro


Uma criancinha, filha de um casal muito bilionário, vivia em um condomínio fechado, blindado e lacrado.

O que mais a incomodava eram umas esculturas vivas vestidas de preto, com óculos pretos, que ficavam sempre prestando atenção nela e ao redor.

A casa da pequena bilionária era grande. Tinha tudo pra dar certo. Jardins, árvores, gramas, brinquedos, como escorregador, balanço e mais. Tinha muitas escadas, janelas, cadeiras e quadros.

O pai da pequena bilionária era um executivo de prestígio. Ele investia em quadros.

Havia muitos quadros estranhos. Não era bem os desenhos que ela assistia no room theatre; eram mais curiosos e não ilustravam nenhum Disney.

A pequena bilionária convivia com eles a muito tempo. Ela já tinha dialogado com os pequenos detalhes de cada obra.

A menina conversava com os quadros e tudo isso era numa outra dimensão, uma outra realidade, outra diversidade, outras representações.


O condomínio onde a pequena bilionária vivia estava excitadíssimo. Crianças e alguns adultos fariam uma excussão numa vã blindada pela cidade. A primeira vez.

Iriam visitar a cidade onde “não” viviam.

A pequena bilionária ficou pensativa: as conversas preocupantes de seus pais durante as refeições, os ursinhos carinhosos, as cantigas dóceis, cds com canções educativas em tons divertidos, e aqueles quadros oníricos.

Partiram todos. Depois de muita distância, a pequena bilionária avistou que iriam passar por um viaduto. Lembrou de um dos quadros de uma das paredes da sua casa grande.

O motorista da vã blindada seguiu pelas poucas e congestionadas vias viáveis. Por baixo, carros. Dos lados carros. Acima carros. Todos entre um fumê de fumaças.

Ela notou outras coisas desagradáveis e marcantes também. Lembrou das conversas preocupantes de seus pais.

Começou a desacreditar nas musiquetas dóceis, na existência dos fofos.


Bem, vamos ao título!

Na sua espaçosa casa tinha um quadro em que o viaduto levava às nuvens. Poderia também subir escadas largas ou optar por rampas gostosas.

A pequena bilionária lembrou que o quadro tinha luminárias. Pensou nas diferentes luzes deste quadro. Luzes que brilhavam, luzes que escondiam; luzes brincantes.

Eram figurativas as nuvens, não fumaças borradas e impregnantes que formavam as galerias sobre o mar. Tudo era calmo e não havia preocupação.


A pequena bilionária pediu ao motorista da vã blindada, educadamente, para assim que possível, na primeira oportunidade, a devolvesse para os seus quadros; seu condomínio fechado.


João Batista Guimarães Alves.

15/04/2011

terça-feira, 22 de março de 2011

Opinião e Memória.


QUERO PATHÉ COM CAFEZINHO.

Observo, com inquietação, esse entrave do desejo popular em relação a reabertura do Cine Pathé. É como se fosse uma tarefa hercúlea. Não deveria. Ao contrário de estar inquieto, gostaria de, quietinho, ficar com a minha namorada no Café Três Corações, aguardando pacientemente por uma sessão no Pathé. Nenhum dos dois opera como antes. Muito triste!
Veja bem: o corpo do Pathé está lá, faminto e sujo; mas ao passarmos por ele, não deixamos de receber um olhar de muita elegância. Já o segundo referido, onde eu faria minha prévia antes do cinema, queimou o filme. O último quadrante da Praça da Savassi - onde procuramos entretenimento, comunhão de prazeres e idéias - foi trocado por uma operadora de telefonia celular. Ora bolas! Celular é ótimo, principalmente para convidar amigos para um cineminha, mas eu compro em qualquer portinhola ou pela internet. Esses nobres espaços, meus amigos, não resistiram à força do mercado; são paradoxalmente populares, onde frequentam seres humanos com seus "pets" ou "pet boys" ou "girls" - é um barato! - que gostam do fomento cultural e da diversidade de prazeres que a Savassi potencialmente tem. E nobreza é enxergar o que as pessoas realmente querem.
Eu, um mero contribuinte, não trocaria meu café com Pathé por um atendimento feito pelas belas mocinhas nas operadoras. Quero ação rápida e com responsabilidade social. Tirou algo, coloquem outro algo melhor ali ou lá. Mas coloquem. Não fiquem aí, senhoras empresas, pelos quatro cantos, a verem nuvens passando. As senhoras oferecem seus produtos e serviços de qualidade e qualidade é obrigação. Hoje, para receberem o tratamento de senhoras respeitadas, permutem com a comunidade um pouco do lucro intangível, no caso, a cultura. Tangível, o dinheiro, nós o ofertamos de cheio. Onde está a contrapartida? A fama de maquiavélicas e dominadoras impositivas eu sei onde está.
Já desde a década de 60 que as grandes marcas vêm se esforçando para a melhoria do que obviamente nos convém: o bom relacionamento simbiótico empresa/sociedade. É isto que nos interessa; pelos seus produtos pagamos muito, e eles são apenas coisas. Marcas são promessas e estão edificadas em exímios valores e atributos que deverão ser cumpridos. Eu, o mesmo mero contribuinte, chegaria antecipadamente ao filme para, com orgulho, assistir a propaganda institucional dizendo: empresa tal patrocina este cinema, subsidiando um bem para a Savassi.
O passarinho voa. E olhem como é lindo!


Em Brancas Nuvens


Quando o nada ocupa seu tempo,

seu tempo afoga e você nada.

Último Capítulo.


Não quis levar nada.
Já havia excesso de peso na cabeça.
O ideal seria eliminar os pensamentos para não afundar de imediato, mas não queria contaminar nada porém, no caminho.
Não tinha direção.
Quis a companhia de um cachorro.
Ninguém mais interessava.
Não tinha sequer cachorro no caminho; mas isso agora daria uma direção: procurar por um.
Quando encontrasse, iria levá-lo a um Campus Federal, a uma Faculdade de Veterinária.
Seria esse seu último contato humano, numa veterinária!
De lá partiria novamente sem direção, na companhia do cão.
O caminho teria de ter água e comida para ele; o cão.

21mar2011